A proposta de Projeto de Lei apresentada pela Confederação Nacional dos Trabalhadores Em Educação – CNTE objetiva a regulamentação do art. 206, VIII da Constituição Federal, que dispõe:

“Art. 206. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:

(...)

VIII - piso salarial profissional nacional para os profissionais da educação escolar pública, nos termos de lei federal. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 53, de 2006)”

E a Lei Federal mencionada no inciso VIII do art. 206 da Constituição Federal, acima transcrito, qual seja, a Lei nº 12.014/2009 de 6 de agosto de 2009, veio a discriminar as categorias de trabalhadores que se devem considerar profissionais da educação básica.

Ocorre que, em face de existência do Plano de Carreira do Magistério do Rio Grande do Sul, Lei nº 6.672/1974, percebe-se uma sobreposição de leis que incluem determinadas categorias profissionais, já albergadas pelas disposições da Lei nº 11.738/2008, que instituiu o Piso Salarial Profissional Nacional para os profissionais do Magistério Público da Educação Básica.

Tal realidade se constata quando o Projeto de Lei ora em análise define os profissionais do magistério da seguinte forma, no inciso I do § 4º do art. 2º:

“docentes, profissionais que oferecem suporte pedagógico direto ao exercício da docência, tais como, direção ou administração escolar, planejamento, inspeção, supervisão, orientação educacional e coordenação pedagógica.”

Temos que tais profissionais se encontram abrangidos pela Lei do Piso Nacional já existente visto estarem incluídas no Plano de Carreira do Magistério Gaúcho, sendo que o Projeto apresentado se mostra prejudicial a estes no momento em que estabelece a sua vigência a partir de janeiro de 2017, enquanto que aludida Lei tem como marco inicial já definido pelo Supremo Tribunal Federal em abril de 2011.

No mesmo sentido, os índices de atualização dos valores estabelecidos não guarda correspondência com o texto da lei já existente, cujos efeitos pendem de modulação daquela mesma corte superior.

Já em relação ao disposto no inciso II do § 4º do art. 2º do Projeto de Lei em comento, restam descritos como profissionais da educação aqueles constantes no inciso III do art. 61 da Lei nº 9.494/96, quais sejam:

“funcionários administrativos da educação habilitados em curso com base técnico-pedagógica para atuação nas escolas públicas...”

Aqui constatamos nova sobreposição legislativa, visto que tal previsão legal abrange alguns profissionais que compõem o Quadro de Servidores de Escola previsto na Lei Estadual nº 11.672/2001, causando disparidade entre integrantes de um mesmo quadro funcional, ocasionando a necessidade de alteração nas carreiras até então existentes.

A criação de legislação própria para fixação de um Piso Salarial para os profissionais da educação pública de nível básico deve ocorrer de forma a contemplar de maneira igualitária a todos os servidores que exercem suas atividades nas escolas públicas, sem que seja desconsiderada a legislação estadual já existente nem criadas novas disparidades nos vencimentos de membros de um mesmo quadro.

A realidade posta no Estado do Rio Grande do Sul não resta contemplada pela proposta de lei apresentada, visto que todos os membros do magistério público gaúcho devem buscar a aplicação integral da Lei nº 11.738/2008 para recebimento do seu Piso Salarial, já devido desde abril de 2011, enquanto que os demais servidores que exercem suas atividades nas escolas gaúchas não estão abarcados por completo na proposta apresentada, ocasionado distorções dentro do mesmo quadro que compõem.

 


 

Confira abaixo a íntegra da proposta do Projeto de Lei:

 

PROPOSTA DE PROJETO DE LEI SOBRE O PISO SALARIAL NACIONAL DOS PROFISSIONAIS DA EDUCAÇÃO ESCOLAR PÚBLICA                              

Regulamenta o inciso VIII do artigo 206 da Constituição Federal, para instituir o piso salarial profissional nacional para os profissionais da educação pública de nível básico.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA

Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

Art. 1º Esta Lei regulamenta o piso salarial profissional nacional para os profissionais da educação escolar pública a que se refere o inciso VIII do artigo 206 da Constituição Federal.

 

Art. 2º O piso salarial profissional nacional para os profissionais da educação escolar pública será de R$ ________ (________) mensais, para os profissionais a que se refere a Lei nº 12.014, de 6 de agosto de 2009, habilitados em cursos de nível médio com base pedagógica para atuação nas escolas públicas.

§ 1º O piso salarial profissional nacional é o valor abaixo do qual a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios não poderão fixar o vencimento inicial das Carreiras dos profissionais da educação com formação de nível médio profissional, para jornadas de trabalho de, no máximo, 40 (quarenta) horas semanais.

§ 2º Nos entes federativos em que houver mais de uma carga horária para os profissionais a que se refere o § 1º deste artigo, será aplicada a proporcionalidade em relação a uma jornada de trabalho específica não superior a 40 horas semanais.

§ 3º Na composição da jornada de trabalho dos profissionais do magistério, observar-se-á o limite máximo de 2/3 (dois terços) da carga horária para o desempenho das atividades de interação com os educandos e, aos profissionais a que se refere o inciso III do art. 61 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, será garantida a formação continuada e a participação desses educadores nos processos de gestão democrática e de preparação, execução e avaliação do projeto político-pedagógico da escola, em horários de trabalho e em escalas elaboradas pelas equipes responsáveis pela consecução do projeto pedagógico previsto no inciso I do artigo 14 da Lei nº 9.394, de 1996.

§ 4º Para os fins do disposto neste artigo, consideram-se:

I - profissionais do magistério: docentes, profissionais que oferecem suporte pedagógico direto ao exercício da docência, tais como, direção ou administração escolar, planejamento, inspeção, supervisão, orientação educacional e coordenação pedagógica;

II – profissionais da educação do inciso III do art. 61 da Lei n º 9.394, de 1996: funcionários administrativos da educação habilitados em cursos com base técnico-pedagógica para atuação nas escolas públicas, regidos pela Resolução nº 5, de 2005, da Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação e outras que lhe sucederem.

§ 5º As disposições relativas ao piso salarial de que trata esta Lei serão aplicadas a todas as aposentadorias e pensões dos profissionais da educação pública de nível básico alcançadas pelo art. 7º da Emenda Constitucional nº 41, de 19 de dezembro de 2003, e pela Emenda Constitucional nº 47, de 5 de julho de 2005.

 

Art. 3º O valor definido no art. 2º desta Lei passará a vigorar a partir de 1º de janeiro de 2017, corrigido pelo critério do § 1º do art. 5º desta Lei desde a data da sanção presidencial.

 

Art. 4º A União complementará o valor do piso salarial profissional nacional, nos casos em que o ente federativo, a partir da consideração dos recursos constitucionalmente vinculados à educação, do esforço fiscal previsto no § 1º do art. 75 da Lei 9.394, de 20 de dezembro de 1996, a ser definido em regulamento, e das disposições que integram o Sistema Nacional de Educação, não tenha disponibilidade orçamentária para cumprir o valor fixado.

§ 1º O ente federativo deverá justificar sua incapacidade financeira, enviando ao Ministério da Educação solicitação fundamentada e acompanhada de planilha de custos comprovando a necessidade da complementação de que trata o caput deste artigo, mediante os critérios estabelecidos nos incisos deste parágrafo, podendo ser acrescidos outros por meio de normativa aplicada em âmbito do Sistema Nacional de Educação:

I – Comprovar a aplicação do percentual mínimo disposto no art. 212 da Constitucional Federal e no art. 60 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, incluída as receitas resultantes de transferências em manutenção e desenvolvimento do ensino;

II – Apresentar relação nominal dos profissionais vinculados aos órgãos que administram a educação escolar pública e seus vínculos diretos com as atividades das escolas ou da rede de ensino;

III – Manter relação de número de estudantes por profissionais da educação nos termos da Lei Federal ou de normativa do Sistema Nacional de Educação;

IV – Ter aprovado Lei específica que designa recursos próprios de royalties do petróleo, de gás natural e outros hidrocarbonetos, nos termos mínimos definidos na Lei nº 12.858, de 9 de setembro de 2013;

V – Preencher regularmente o Sistema de Informações sobre Orçamentos Públicos em Educação (Siope);

VI – Cumprir o regime de gestão plena dos recursos vinculados para manutenção e desenvolvimento do ensino, em especial o cumprimento do § 5º do art. 69, mantendo o controle dos recursos educacionais em conta própria da Secretaria de Educação;

VII - Dispor de plano de carreira para os profissionais da educação em lei própria e nos termos do Plano Nacional de Educação ou de Lei Federal específica;

VIII – Demonstrar cabalmente o impacto desta Lei nos recursos do Estado, Distrito Federal ou Município, quando de sua aplicação aos planos de carreira dos profissionais da educação escolar pública.

§ 2º A União será responsável por cooperar tecnicamente com o ente federativo que não conseguir assegurar o pagamento do piso na estrutura das diretrizes nacionais para os planos de carreira dos profissionais da educação escolar pública, de forma a assessorá-lo no planejamento e aperfeiçoamento da aplicação de seus recursos.

§ 3º A complementação da União a que se refere o caput deste artigo terá como fontes principais os recursos previstos na Lei nº 12.858, de 9 de setembro de 2013, e outras correlatas, além de rubrica específica do orçamento federal, observado o limite máximo de 30% dos recursos vinculados ao Ministério da Educação para manutenção e desenvolvimento do ensino, sendo vedada a utilização das receitas oriundas da arrecadação da contribuição social do salário-educação a que se refere o § 5º do art. 212 da Constituição Federal.

 

Art. 5º O piso salarial nacional dos profissionais da educação escolar pública será atualizado, anualmente, no primeiro dia útil do mês de maio, a partir do ano de 2018.

§ 1º A atualização de que trata o caput deste artigo será calculada com base no mesmo percentual de reajuste anual do Custo Aluno Qualidade Inicial (CAQi) e do Custo Aluno Qualidade (CAQ), expressos nas estratégias 20.6 e 20.7 da Lei nº 13.005, de 25 de junho de 2014.

§ 2º Ato normativo do Ministro de Estado da Educação indicando o percentual de reajuste do piso salarial profissional nacional será publicado até o dia 30 de abril de cada ano.

 

Art. 6º A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios deverão elaborar ou adequar os Planos de Carreira e Remuneração dos profissionais da educação escolar publica, tendo em vista o cumprimento integral desta Lei nos prazos e condições por ela determinados.

 

Art. 7º Constitui ato de improbidade administrativa a inobservância dos dispositivos contidos nesta Lei, sujeito às penalidades previstas pela Lei no 8.429, de 2 de junho de 1992 e pela Lei ______________, que trata da Responsabilidade Educacional dos gestores públicos das esferas federal, estadual e municipal.

 

Art. 8º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

 

JUSTIFICAÇÃO

O presente projeto de lei tem por objetivo regulamentar o art. 206, VIII da Constituição Federal, o qual teve sua redação conferida pela Emenda Constitucional nº 53, de 2006.

O assunto trata não apenas de reivindicação histórica do movimento sindical de trabalhadores em educação, mas especialmente de uma dívida do Estado brasileiro para com os profissionais da educação e a sociedade, que clama por educação pública de qualidade e a consequente valorização de seus profissionais.

A abrangência do projeto se pauta na Lei nº 12.014, de 6 de agosto de 2009, que regulamentou o parágrafo único da Constituição Federal, com a finalidade de discriminar as categorias de trabalhadores que se devem considerar profissionais da educação básica.

Neste sentido, são detentores de direito ao piso salarial profissional nacional dos profissionais da educação escolar pública, os(as) professores(as), os(as) especialistas e os(as) funcionários(as) da educação, respectivamente listados nos incisos I a III do art. 61 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (nº 9.394, de 1996), habilitados em cursos com base pedagógica reconhecida pelo Ministério da Educação (MEC) e pelo Conselho Nacional de Educação (CNE) para atuarem nas escolas públicas.

O valor definido no art. 2º do projeto de lei atende parcialmente a prerrogativa das metas 17 e 18 da Lei 13.005, de 2014, que aprovou o Plano Nacional de Educação com vigência entre 2014 e 2024. O cumprimento integral e efetivo das referidas metas dependerá ainda da aprovação de Lei que regulamente as diretrizes nacionais para os planos de carreira dos profissionais da educação, matéria correlata a este projeto de lei.

No caso do magistério, especificamente, o PNE estabelece prazo de 6 (seis) anos, a contar da publicação da Lei, para que seja equiparada a remuneração média desses profissionais com a de outras categorias de igual escolaridade. Em 2012, de acordo com dados da Pesquisa Nacional de Amostra por Domicílio – Pnad/IBGE, a diferença era de 53% entre os profissionais com formação em nível superior.

Por óbvio, não basta a Lei do Piso para se alcançar a pretendida equiparação remuneratória acima referida, sendo necessária política nacional para valorizar a estrutura de carreira do magistério e dos demais profissionais, com o devido suporte financeiro da União, com vista a garantir equidade no tratamento aos profissionais de todo país e sustentabilidade financeira aos entes públicos responsáveis diretos pela contratação dos trabalhadores das escolas públicas.

O piso nacional se vincula à formação profissional em nível médio, tanto para o magistério como para os demais profissionais da educação, bem como a carga horária semanal de no máximo 40 horas semanais, devendo as redes de ensino com múltiplas jornadas de trabalho aplicarem a proporcionalidade do piso para uma jornada específica sobre as demais que se praticam na rede/sistema educacional.

Ainda sobre a carga horária, o projeto estabelece percentual de hora extraclasse para o trabalho dos professores (mínimo de um terço da jornada), dando efetividade ao inciso V do art. 67 da LDB e mantendo a coerência com o paragrafo § 4º do art. 2º da Lei nº 11.738, de 2008. Quanto aos demais profissionais, é assegurado tempo dentro da jornada de trabalho para formação continuada e para a participação em atividades relacionadas a planejamento, execução e avaliação do projeto político-pedagógico das escolas.

Diante da diversidade de denominações dos profissionais da educação em todo país, o projeto optou por definir as habilitações compatíveis com o piso salarial profissional, observando o disposto no art. 22 da Lei nº 11.494, de 2007, bem como os artigos 61 e 62 da LDB e as normatizações do Conselho Nacional de Educação, em especial a que regulou a 21ª Área Profissional de Serviços de Apoio Escolar.

Para que as metas do PNE sejam efetivamente alcançadas no quesito remuneratório dos trabalhadores em educação, é imprescindível que o valor definido para o piso, em 2015, com base em dados mais recentes da Pnad-IBGE, sejam atualizados à data de vigência da Lei utilizando o critério de correção permanente que será aplicado a partir de 2018.

Também em relação à valorização real do piso salarial ao longo do tempo, a opção do projeto é por sua vinculação ao mesmo percentual de correção do Custo Aluno Qualidade (inicial e permanente) – política indicada no PNE para servir de referência aos investimentos orçamentários na educação pública –, observando-se a data do primeiro dia útil de maio para a atualização anual de acordo com a publicação de ato normativo do ministro de Estado da Educação.

A complementação da União mostra-se fundamental não apenas para legitimar a constitucionalidade do projeto – à luz da votação da ADI 4.167 no STF –, mas principalmente para garantir a efetividade da Lei diante da concepção do regime de cooperação estabelecido pelos artigos 23 e 211, § 1º da CF-1988, indispensável para se alcançar a melhoria da qualidade da educação pública básica no país e a valorização de seus profissionais.

Para tanto, o projeto de lei estabelece critérios a serem seguidos pelos entes federativos, os quais poderão sofrer atualizações em âmbito de um comitê gestor do Sistema Nacional de Educação.

Por fim, destaca-se a importância de se vincular essa legislação a medidas de controle institucional e judicial, com punições efetivas àqueles que a descumprirem.

 

  • Data: 31.07.2015